Deixa a vida me levar...

A vida é difícil e muitas vezes não sabemos bem para onde vamos. Vamos indo na base do “Deixa a vida me levar”... Já era moço, mas não sabia o que fazer da vida e fui procurar emprego. 

Mas o destino quis que eu não arrumasse o emprego pretendido, mas fosse para o exército, servir a pátria como se diz. Então por longos meses vesti a farda verde-oliva e servi as armas nacionais. Saí do quartel ainda sem muito rumo, decidi fazer o "cursinho" para vestibular de Medicina. Naquela época as opções não eram muitas para os jovens, ou se fazia Medicina, Engenharia ou então Direito. 

Não tinha muita aptidão matemática e o direito não me atraia, então resolvi tentar a Medicina, mais por exclusão, pois na época era uma boa profissão, mas bastante sacrificada que exigia longos estudos e demorada preparação. Mas mesmo assim fui tentar. Era estudioso, embora sem muito método, gostava de leituras, a biologia a meu ver era uma matéria muito interessante, gostava das ciências em geral, de maneiras que não estava fora de minha vocação. Uma vez no "cursinho" tive dificuldades, porque havia parado de estudar um ano por causa do exército, mas com o tempo me firmei nos estudos. 

O que me matava era a cidade grande, enorme, impessoal, pra aquela época São Paulo não era ainda uma megalópole, ou então o termo ainda não tinha sido inventado. Durante a semana os estudos me tomavam praticamente todo o tempo, vivia às expensas de meu pai, com uma pequena mesada, mas dava para cobrir os estudos, e ainda sobrava algo para o cinema durante o final de semana. Década de 60, o cinema estava em sua fase áurea, os filmes eram maravilhosos, e eu me maravilhava com tantas fitas e tantas histórias fantásticas da sétima arte. 

Os cinemas pululavam, eram muitos e haviam filmes para todos os gostos. Desde faroeste, dramas, comédias, ficção, aventuras e românticos. Então não parava de ir assistir a filmes exibidos em  salas simples, até belos locais de espetáculos tipo cinerama. O cinerama então era muito interessante, pois criava a ilusão dos objetos irem em direção ao espectador, por exemplo: um trem em alta velocidade, dava impressão que o mesmo ia sair da tela e entrar no cinema adentro a ponto das pessoas abaixarem-se tal a realidade do espetáculo. 
O som estereofônico maravilhoso dava impressão que as granadas explodiam ao lado do espectador. Entre uma sessão e outra de cinema haviam muitos estudos, pois o vestibular não era nada fácil, muitos candidatos e muito poucas vagas. Havia na época o drama dos excedentes, ou seja, àqueles que embora com boas notas, não conseguiam vagas nas poucas escolas existentes. Terminado o cursinho chegou minha vez de tentar e o mesmo aconteceu, até que não fui mal nos exames, mas não haviam vagas. Até que houve um movimento estudantil para o aumento de vagas nas Universidades. 

O governo se mostrou sensível e novas escolas médicas foram abertas e com isso consegui a tão almejada vaga, quando vi que tinha que desistir, mas na última hora esta surgiu em uma cidade chamada Marília. Nome bastante simbólico, pois Marília era a musa de Tomás Antonio Gonzaga, um dos Inconfidentes que lutaram pela Independência do Brasil em uma malograda revolta em Ouro Preto Minas Gerais, que visava a proclamação da Independência. Era um intelectual e poeta do pastoreio que escrevia as Éclogas, poesias que valorizava a vida no campo, ou seja, a vida pastoril. 

A sua musa chamava-se Marília e o poeta Inconfidente adotou o pseudônimo de Dirceu. Daí o nome da cidade se chamar Marília de Dirceu. Fui em direção a importante cidade de minha juventude, cheguei pela madrugada ao longe avistei a bucólica cidade, com suas luzes tremeluzentes, tive um aperto no peito, tal localidade de alguma maneira me chamou a atenção, gostei dela logo de cara. Qual a surpresa fui aprovado nos exames e chamado pra cursar Medicina. Foram longos anos de estudos sem faltar peripécias das mais interessantes. Namorei também várias garotas, fui amado e detestado. 

No atacado tive muitos acertos, mas errei no varejo, em detalhes. E ao fim do curso deixei a cidade para seguir a vida de formado em outro local que nada mais é que novamente a capital do Estado. Tive várias outras aventuras juvenis, mas não era muito mais moço. E comecei a pensar seriamente em casar, ato contínuo casei-me no ano seguinte.

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