Meu Tipo Inesquecível
Meu Tipo Inesquecível
Quando eu era adolescente gostava de uma revista chamada Seleções, muito boa, aliás, com artigos variados, tinha uma seção muito interessante entre outras que tinha por título: Meu Tipo Inesquecível, pois é, nesta seção geralmente se desenvolvia um artigo interessante de um algum autor sobre uma pessoa notável em algum ramo da atividade humana, ou que tinha alguma característica peculiar. Então havia o desfile de várias personalidades, mas muitas vezes não precisava esta pessoa ter escrito um livro ou escalado uma montanha. Na maioria das vezes eram pessoas simples mesmo, a avó do autor, uma tia ou vizinho, mas que tinha uma história interessante desta pessoa.
Se eu fosse escrever meu Tipo Inesquecível, a minha mãe preencheria todos os quesitos, pois era uma pessoa interessantíssima que muito me marcou, quer pela paciência, sua perseverança, fé e sabedoria. Pra começar ela sabia de todas as histórias interessantes e engraçadas do bairro. Uma espécie de cronista, conhecia histórias de assombrações e do Pedro Malasartes, este ultimo como o próprio diz vivia fazendo artes e pregando peças nos mal avisados. Sabia histórias da escravidão, do Lampião e Maria Bonita, do Corpo Seco e do Saci Pererê. O Saci Pererê era um moleque bem escurinho de uma perna só que vivia assobiando pelo mato. Provocava vento e fazia redemoinhos, atrapalhava a crina dos cavalos, e fazia as pessoas perderem coisas. Sabia também o coaxar dos sapos e o que significavam: Uns faziam gamelas de acordo com seu coaxar, outros tocavam instrumentos, assobiavam, etc.
Ela teve uma vida muito dura, desde criança trabalhou pesado em engenhos de fazer rapaduras, o adoçante que precedeu o açúcar, que, aliás, era muito melhor, mas acabou só subsistindo no interior de Minas Gerais. Como toda pessoa sofrida era triste e não gostava de rir muito, trabalhava duro, como todo o mundo fazia naquela época de vida rural intensiva. Tudo ou praticamente tudo saia da fazenda, só se ia à cidade pra comprar fósforos, sal e roupas que não se fabricavam nas fazendas ou sítios. No mais tudo ali era produzido: a carne, o leite, a manteiga, a banha, a farinha, rapadura, verduras e frutas. As cidades eram pequenas e de pouco comércio, a ponto das cidades dependerem quase completamente da zona rural. Mas claro isso mudou. Então, estava dizendo que ela era triste, mas até certo ponto. Pois a vida familiar era o ponto forte daquela época, as famílias eram muito mais estáveis, e tudo praticamente girava em torno desta.
As festas, as visitas de uma família a outra. Determinada família vinha nos visitar, então ficávamos devendo uma visita de cortesia à mesma, que logo era combinado para o próximo domingo ou feriado. Também vivendo e observando isto acho que fiquei muito caseiro e aprecio também esta vida familiar que infelizmente acabou. Estava falando de sua tristeza, as vezes, mas nem sempre, pois ela adorava visitas e conversar, contar suas histórias. O riso embora sendo uma mulher pequena era impressionante e tonitruante, parecia que ela ria com o corpo todo e com a alma. A alegria tomava conta dela. Então minha mãe foi o meu Tipo Inesquecível.
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