Tem alvorada, tem passarada...






O dia amanheceu com um friozinho outonal, mas já a força do sol dissolveu a névoa, eis o calor já presente, estou um pouco ocioso, nesta manhã tinha um compromisso, mas não consegui desmarcar, lá pelas nove. Lembrei-me do meu som antigo que comprei, decerto na época era moderno, mas hoje coitado muito superado pelas maravilhas eletrônicas do mundo atual. Ponho a reflexionar sobre o passado e vejo que não tínhamos as maravilhas eletrônicas de hoje, era o velho radinho mesmo. Tinha uma porção de “ondas”: Curtas, medias, frequência modulada. Quando a tardinha ia findando principalmente no verão, muito modorrenta e preguiçosa, meu pai dizia: Luiz vá até o açude e  abra a represa, esta fazia funcionar pequeno dínamo que fornecia eletricidade a nossa casa, pasmem vocês por cerca de duas horas mais ou menos, após então esta secava e tinha que ser fechada, para ouvirmos a maravilha da tecnologia no outro dia, o nosso radinho. Papai ouvia a tarde as músicas do Tonico e Tinoco, aquelas vozes límpidas e sonoras enchiam o sertão de melodia: Era a tristeza do Jeca, a gente chorava também:

"Nestes versos tão singelos,
Minha bela meu amor,
Pra vc quero contar 
meu sofrer e minha dor,
Eu sou como a sabiá
quando canta é só tristezas,
faz o galho derriçar"

O som plangente da Viola Caipira enchia o sertão de melodia, as vozes dos violeiros lindas e simples como o sertão. Penso hoje quanta diferença! A vida mudou radicalmente, só se pensa em dinheiro e em materialismo. O sentimento, o amor foi embora pras “cucuias”. A simplicidade também tem que ter ouro, tem que ter joias caras, porque senão a mulher não brilha, e o brilho é importante, tem que ser linda. Outras coisas pouco interessam, as cirurgias plásticas são uma constante, principalmente para as mulheres, mas os homens também entraram nesta, a ponto do Brasil ser o segundo país do mundo nestas cirurgias, apenas superado pelos States, e ainda dizem que é um país pobre. Diria sim, um país de oportunidades desiguais, onde poucos têm muito e muitos não têm quase nada pra sobrevivência. Saudade do sertão mesmo. Onde o caboclo na sua casinha de sapé, pobre, pouco tinha, mas tinha a tuia cheia de cereais pro ano todo. Diziam que o caipira era indolente, mais uma “balela”, caipira era prático, pois queria ver o seu celeiro cheio a passar fome, nada de Jeca Tatu, e sim homem prático, que queria ver sua família bem alimentada e ouvir o Tonico e Tinoco. Hoje quanta diferença! Dizem que é o progresso, mas duvido um pouco. A fome e a miséria campeiam, as pessoas não tem alimento, somos dominados pelas multis. Se eu pudesse voltava àqueles tempos: E cantaria:
 “Caboclinha linda,             do meu bem querer,             É triste a saudade,             Longe de você"


Tonico e Tinoco.

Comentários

Ana Lúcia disse…
Luiz, que lindo. Hoje você está saudoso e inspirado. Mas, são momentos na vida que não se esquecem. Seu pai , a luz que dependia da água da represa, a poesia no canto de Tonico e Tinoco,o som da viola, o ontem e o hoje tão diferentes.Parabéns! Gostei muito!
Este comentário foi removido pelo autor.
Obrigado Ana pelo seu comentário que muito me honra. Considero-me um privilegiado por ter vivido estes anos e por ter tido a família que tive, devo agradecer a Deus por isto. A felicidade está no amor e no trabalho honesto e persistente do meu pai que até hoje é o meu modelo de pessoa que eu amo.

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