Uma tarde de brincadeiras...



A tarde era daquelas bem modorrentas e preguiçosas, tudo na maior calma, o sol lança seus últimos raios sobre a terra, fazia um calor bem gostoso, soprando uma brisa de leve, neste cenário rural e sem muita coisa para fazer, éramos adolescentes, recém saídos da infância, nos pusemos a brincar. A porta de nossa residência era o melhor lugar, além de apreciar belo cenário não atrapalhava os adultos lá pra dentro de casa, que era do estilo antigo, longa e cheia de janelas, parecendo àquelas fazendas do período colonial do café. A batucada ia animada, meu irmão tocava uma lata velha improvisada de instrumento de percussão e eu uma violinha que havia ganhado de minha avó.

O ritmo devia ser bem fora do compasso, porque não sabia tocar viola, mas como disse antes, era apenas uma brincadeira, para espantar a tristeza do dia que findava. Já havíamos feitos isso, mas esse dia foi diferente, aconteceu algo inusitado, estamos entretidos em nosso batuque, quando de repente surgiu alguém na porteira da pequena fazenda que ficava a poucos metros de nós. E numa voz mais cavernosa possível, certamente queria assustar, disse me dá um “pousinho”, o crepúsculo já caia nessa hora, como se diz é um lusco- fusco, não é noite, mas também não é dia. A visibilidade fica atrapalhada, por não termos ainda os astros noturnos para nos iluminar, também a luz do dia já de nós se despedia. 

Ao ouvir tal voz meu irmão sumiu, não sei pra onde? Fiquei sozinho com a figura insólita toda enrolada num cobertor com o objetivo de nos assustar por certo. Então pensei só pode ser minha tia, moça nova ainda adolescente que quer pregar- nos uma peça, passei a pequena porteira e fui ao seu encalço, pois ela corria, pela silhueta dava para afirmar que era uma mulher, consegui alcançá-la com o objetivo de desmascará-la tirando-lhe o disfarce, ou seja, o cobertor em que estava enrolada. Mas a criatura era forte e eu muito leve e franzino. De maneira que ela dava voltas comigo grudado e eu não conseguia divisar seu rosto e nem tampouco retirar-lhe aquele disfarce, mas teve uma hora em que vi seu rosto

Era uma morena bonita, cabelos compridos com cachos. Mas não consegui reconhecer se era uma das minhas tias que viera nos assustar. Até hoje penso lembrando-me daquela tarde. Quem era a sinistra figura que nos pediu um pouso e depois sumiu no pó da estrada?  Seria uma alma penada? Seria mesmo minha tia e não consegui divisá-la devido a pouca luz crepuscular? Então coloco os olhos em minha infância e vejo quão boa era, como nos divertíamos com pouca coisa, como era boa a vida, simples, singela, cheia de brincadeiras e folguedos. Hoje a gente vê tudo complicado, perdemos a espontaneidade de antanho, pra uma criança o riso é espontâneo, a alegria é fácil, porque ela certamente está mais perto do céu. E vejo o quanto me afastei do que é simples e nos dá felicidade de fato. “No orvalho das pequenas coisas o coração encontra sua manhã e sente-se refrescado”. ( K. Gibran )

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