Histórias de assombrações.



Casarões coloniais de São Luiz do Paraitinga


Contam-se muitas histórias por este mundo de meu Deus, as mais contadas na época de minha infância eram as de assombrações, fogão de lenha aceso, aquelas luzes bruxuleantes das lamparinas a querosene dando pouca iluminação, cada canto se via um fantasma, dependendo da imaginação do caboclo é claro. Mas a faina muito pesada não dava muita trégua à imaginação. Dormia-se cedo para levantar-se de madrugada para trabalhar ou nas roças que lá existiam ou então nos cafezais, mas estes na minha época já não existiam mais. Só ficaram de lembrança as casas coloniais dos barões do café, dizem que os escravos haviam sofrido muito, eram chibatadas, correntes amarradas ao pescoço, máscaras de ferro para castigar os mais recalcitrantes. Para piorar os negros sofriam o “banzo”, diziam que era tristeza da terra natal. Muitos morriam devidos aos maus tratos. 

Estas fazendas com o término do ciclo do café, e da libertação dos escravos ficaram meio abandonadas, daí então aumentou a fama destas casas serem mal assombradas. Existia uma fazenda colonial lá pelas bandas do Bairro do Macuco, município de São Luiz do Paraitinga, que ficou muito famosa por ser mal assombrada, não havia quem pernoitasse lá por mais corajoso que fosse o caboclo. Até havia uma aposta para quem conseguisse, era uma ampla residência assobradada com inúmeros janelões e portas de madeira, escadas e assoalhos rangedores por serem velhos e estarem sendo atacados por carunchos e cupins, era uma casa muito lúgubre mesmo dava medo dormir lá.  Sabendo-se que muitos escravos ali tinham sofrido suplícios e morrido nas mãos de carrascos desalmados. Dizem que neste lugar havia uma assombração muito feia e o fulano mesmo tendo “tutano” não conseguia lá passar a noite.. Mas teve um caboclo que topou, seu Zé Bento, disse que lá dormiria, pois não tinha medo de almas penadas e assombrações não existiam. 

Os amigos duvidaram, embora sabendo que o homem era corajoso, mas esta parada ele não agüentaria. Dito e feito, dia combinado, seu Zé se preparou para o evento, munindo-se de sua capa gaúcha para o caso de fazer frio no casarão e uma garrafa da boa pinga Luizense, para aumentar a coragem, pois ele sabia também que a empreitada ia ser dura, além do mais fez suas orações habituais de católico fervoroso e devoto da Virgem Aparecida. Se instalou no salão do casarão, só uma lamparina e um isqueiro lhe fazia companhia para fumar um cigarro e espantar os pernilongos que deviam ser muitos na casa abandonada. No início tudo bem, caboclo dorme cedo e este já bem relaxado com o efeito da caninha, dormiu muito bem, mas acordou com barulhos e gemidos que não conseguia localizar, parecia alguém sofrendo muito ou sendo enforcado, correntes arrastavam-se pelo interior da residência o ambiente era mesmo de filme de terror. 

O homem pôs-se na defensiva munindo-se de sua garrucha de dois canos que nunca largava para o caso de alguém se aproximar. Mas logo todo barulho cessou como por encanto, mas não por muito tempo, pois do forro da mansão escravagista vinha um gemido de gelar o sangue que dizia: Eu caio... Eu caio... Eu caio... Seu José também já se agastando com tantas assombrações e agora para piorar alguém ficava repetindo as palavras várias vezes parece que para assustar mais, disse então: "Pois então caia"... Então caiu um braço de um homem, novamente repetindo a mesma cantilena: Eu caio..., pois então caia, sempre falava seu José que já estava de garrucha em punho, caiu outro braço e assim por diante foram caindo pedaços do homem; membros, tronco até que as partes se juntaram e num passe de mágica formou-se um homem completo que lhe disse: Seu José devido a sua coragem e desprendimento lhe agradeço por agüentar a minha assombração, pois sou uma “alma perdida”, fui senhor de escravo muito ruim, mas quero me redimir de minhas maldades. Ofereceu-lhe uma pá e uma enxada e mandou que cavasse em determinado local do porão da casa. Seu José não tendo outra alternativa começou a cavar cada vez mais até que para sua surpresa deparou-se com um enorme baú, que após aberto estava abarrotado de dinheiro e pedras preciosas, um tesouro incalculável estava ali enterrado. 

Disse-lhe a alma penada, metade deste tesouro é seu pelo seu trabalho de libertação de minha alma, um quarto da fortuna você dá aos pobres e outro um quarto a Nossa Senhora. Dito isto o homem já com sua alma liberta sumiu, ficando seu José a pensar com seus botões, a metade deste fabuloso tesouro é minha, mas como também sou pobre, mas corajoso, fico com um quarto que pertenceria aos pobres. Mas resolveu levar um quarto da fortuna pra Nossa Senhora lá no seu altar, pois com esta não se brinca. È a nossa rainha e protetora dos sertanejos. Dizem que seu José ficou muito rico, com sua parte, e ainda cumpriu suas obrigações com a Santa. Moral da história: O medo nos paralisa e perdemos a coragem de enfrentar as adversidades. Só os homens de coragem vencem na vida e são premiados por vencerem as dificuldades que se nos apresentam.

Comentários

Bia disse…
Essas histórias de assombrações são legais... mas... dá um meeeeedddoooooooooooo!!!
Gostei da observação Bia, leia e comente sempre. Por outro lado é sinal de que a história foi boa.
Claudia Corrêa disse…
Sou de Natividade da Serra, cidade vizinha de São Luiz do Paraitinga. Eu cresci ouvindo meu pai contar essa história, e cada vez que volto a ouvir-la sinto um arrepio como se fosse a primeira vez. Essa história é muito boa! Parabéns
Obrigado Claudia não a conheço, mas conheço esta região, nasci em S. Luiz no Bairro do Rio Acima, gosto muito desta região e das histórias que aí contam. Sou bom contador de histórias, se souber de mais algumas por favor me envie que eu coloco em meu blog. E é claro o nome da colaboradora vai constar. Muito obrigado, volte sempre.
Claudia vc tem facebook? Se tiver me acrescente até ia fazer isto com vc, mas infelizmente não a encontrei. Meu pai era bem conhecido em S. Luiz, era o Zé Vená, ele vendia "tocinho" no antigo Mercado Municipal, pergunte a seu pai que talvez ele se lembre. Um abraço.

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